João Lavrador *
No inicio do mês de Setembro, por iniciativa da Comissão Episcopal das Vocações e Ministérios, realizou-se, em Fátima, o VI Simpósio do Clero de Portugal. Contou com a participação de mais de oitocentos sacerdotes de todas as dioceses portuguesas e da quase totalidade dos Bispos da Conferência Episcopal Portuguesa.
Se é certo que este simpósio se situa na continuidade de outros que se têm vindo a realizar a partir de 1993, data em que teve lugar o primeiro, fica, porém, igualmente enquadrado na vivência do ano sacerdotal.
Foi notória a alegria de todos os participantes pela profundidade da reflexão que lhes trouxeram os conferencistas, conhecedores da alma sacerdotal, da doutrina da Igreja, das ciências auxiliares e da missão dos sacerdotes no mundo de hoje. Mas se este conteúdo teológico-pastoral se pode absorver dos escritos dos seus autores, já o ambiente único de convivência alargada, de partilha fraterna, do diálogo distendido e franco, da riqueza celebrativa, do canto cuidado e da oração comum, puderam ser experimentados tão só por quem aí esteve. Dai a importância da participação de todos aqueles a quem se destinam tais acontecimentos.
Pela partilha que se realizou no âmbito de cada diocese, o respectivo presbitério diocesano poderá beneficiar muito da reflexão e da vivência deste simpósio. Mais ainda, importa fazer chegar à comunidade diocesana e às paróquias esta mesma reflexão e, sobretudo, as suas interpelações. Isto, certamente, se fará a partir das conclusões que se encontram publicadas.
A vocação sacerdotal vive-se na comunidade cristã e para a comunidade cristã. Apesar do que é específico da vocação sacerdotal, bispo e presbítero, esta articula-se com a variedade de carismas e ministérios, absolutamente necessários para a construção da comunidade, à imagem de Jesus Cristo, e para a sua missão no meio do mundo. Mais ainda, se é certo que o sacerdote deve ter o mesmo coração de Pastor, que, segundo o exemplo de Jesus Cristo, deve ir ao encontro dos que estão fora da comunidade, só o poderá fazer, no que toca às tarefas seculares, através dos leigos.
Através do tema «Reaviva o dom que há em ti» (S. Paulo), este simpósio situou-se na reflexão acerca do acompanhamento e da formação permanente dos sacerdotes. Esta exigência está já muito presente na doutrina conciliar, sistematizada na Exortação Post-Sinodal «Pastores Dabo Vobis», requerida pelas interpelações da cultura actual e proposta como vivência da alegria permanente na fidelidade ao chamamento divino.
Salientou-se a atenção à riqueza da vocação sacerdotal, iniciativa de Deus e resposta do homem, mas vivida na fragilidade da pessoa humana. Por isso, sempre a necessitar de humildemente se procurar os meios necessários para viver a fidelidade a este chamamento. Todos estes meios, humanos e sobrenaturais, se incorporam no contexto relacional do sacerdote e na sua inserção na Igreja Comunhão. Neste contexto, a relação entre os sacerdotes, a partilha em presbitério, não só das tarefas, mas também da sua vida interior e das suas preocupações, o aprofundar dos laços de comunhão entre todos, expressados na sua forma de sentir, de pensar e de agir, são de extrema importância.
Daqui somos conduzidos à necessidade da formação permanente. Esta foi a dominante de todo o encontro.
Estamos habituados a relacionar este tipo de formação com algumas iniciativas de carácter teológico-pastoral e espiritual, ao longo do ano. Sem descuidar estas, a novidade aparece ao sublinhar que a formação permanente mais necessária é aquela que se realiza a partir do quotidiano. Começando por reconhecer a necessidade pessoal da formação permanente, que se torna o ambiente natural em que vive o sacerdote, este dedica-se à escuta da Palavra de Deus (lectio divina), à autêntica oração da liturgia das horas, pessoal e mariana, à vivência profunda da eucaristia diária, ao empenho na missão pastoral, ao testemunho dos conselhos evangélicos, como expressão da vida nova em Cristo e da sua libertação, à partilha fraterna, atendendo preferencialmente os mais pobres, e à promoção da comunhão sacerdotal junto dos seus irmãos sacerdotes.
A palavra que mais se ouviu ao longo de todo o simpósio foi «santidade». Necessitamos de sacerdotes santos, que, para corresponderem às exigências da nova evangelização, estejam imersos profundamente em Cristo e capazes de realizar um novo estilo de vida pastoral marcado por uma profunda comunhão com o Papa, com os Bispos e uns com os outros (cfr. PdV, 18), que dEle sejam transparência, que levem os nossos contemporâneos a pensar em Deus. Os sacerdotes de hoje, como os de sempre, são chamados a fazer «ver» Deus (cfr. NMI, 16), pois esta é das maiores solicitações que lhes são colocadas pelos homens e mulheres do mundo actual. Uns colocam esta pergunta abertamente, outros fazem-no de maneira disfarçada. Mas todos sentem necessidade de se encontrarem com Deus.
* Bispo Auxiliar do Porto