A. Teixeira Coelho
Os profetas mantiveram viva a expectativa dos Hebreus relativamente ao acontecimento charneira da sua história: o nascimento, do tronco de David, do Messias Salvador. Quer alentando o povo nos momentos difíceis em que, deprimido, suportava o exílio e a opressão, quer alertando-o nos momentos em que, eufórico, se entregava à idolatria, a palavra dos profetas convidava o povo à esperança.
O nascimento do Salvador acontece no horizonte das expectativas de um povo. Para os cristãos, o nascimento de Jesus, o Natal, é, na história exemplar deste povo e a partir dela, a proclamação a todos os homens do grande e extraordinário acontecimento: Deus, "chegada a plenitude dos tempos", entra na história dos homens, torna-se num deles, faz-se companheiro de caminhada, para levar à plena realização o desígnio de fazer renascer em cada homem o Homem Novo. Desígnio tornado interpelação e apelo a todos os homens e inscrito no íntimo das consciências de cada um deles, "criados à Sua imagem e semelhança". Deus vem, em Jesus, assumir a condição humana e permanece não apenas paradigma, mas espírito e energia dinamizadores desse projecto que é dom, graça e aliança de Deus com o homem e do homem com Deus.
O Natal terá o conteúdo e a qualidade das nossas expectativas pessoais e colectivas.
Cada homem tem um potencial de crescimento nunca esgotado no espaço curto dos seus dias. Por isso se pode dizer que ninguém nasce apenas uma vez; por isso se diz que ninguém deve parar de nascer, sob pena de se limitar às formas com que congelou o seu projecto pessoal de vida. Todos começamos a nascer, todos continuamos a nascer a partir do "património" pessoal que nos cabe aceitar e desenvolver, conforme nos lembra a parábola dos talentos. É neste desafio do que ainda não somos, mas que somos chamados a ser, ou do que somos na imperfeição e, tantas vezes, no sem sentido que o Natal, a celebração do nascimento de Jesus, ganha espaço na trama das nossas vidas, porque é aí que nos encontramos na encruzilhada em que o projecto de Deus se cruza com os nossos projectos para os julgar, orientar e potenciar.
O Natal acontece, hoje, a partir das nossas expectativas, das expectativas deste mundo tão complexo em que nos é dado viver. Onde colocamos a nossa esperança?
A uma sociedade como a nossa, que promove, tão desenfreadamente, o consumismo, o Natal de Jesus recorda o projecto de Deus consubstanciado numa Humanidade Nova, certamente uma humanidade de cidadãos que cultivam a dignidade de cada um e que não se resignam a ser apenas produtores e consumidores. Carecida do sentido quem torne viáveis muitas das suas opções, dos seus projectos, quer individuais, quer colectivos, quer nacionais, quer globais, o Menino do Presépio permanece uma fonte de sentido, do Sentido Último, o Sentido de todos os sentidos, para a humanidade.