S.D.L.
Segundo a praxe, os documentos do Magistério pontifício são conhecidos pelas primeiras palavras da sua versão oficial. Deste modo, a Bula papal que convoca oficialmente o grande Jubileu do ano 2000 chama a atenção para o mistério da Incarnação - «Incarnationis mysterium» (sigla: IM) - que celebramos em cada Natal: «Tendo o mistério da incarnação do Filho de Deus diante dos olhos, a Igreja está para cruzar o limiar do terceiro milénio» (IM 1).
Prestes a celebrar o Natal do Senhor, é oportuno reler e meditar alguns parágrafos deste precioso documento. Na verdade, corremos o risco de reduzir esta quadra festiva a uma estação comercial, a um tempo convencional de bons sentimentos, sem referências próprias nem identidade cristã. Pelo contrário, como se escreveu no subsídio litúrgico preparado para o terceiro ano preparatório, «O Natal é a festa da glória de Deus», «é um mistério de fé que deve resplandecer em nossas obras» (cf. Colecta da Missa da Aurora).
O Santo Padre ajuda-nos a recentrar o Natal no seu núcleo mistérico, recuperando a sua dimensão e preciosidade histórica: «a história da salvação tem o seu ponto culminante e significado supremo em Jesus Cristo. (...). O nascimento de Jesus em Belém não é um facto que se possa relegar para o passado. Diante d'Ele, com efeito, está a história humana inteira: o nosso tempo actual e o futuro do mundo são iluminados pela sua presença » (IM 1).
«Há dois mil anos que a Igreja é o berço onde Maria depõe Jesus e O confia à adoração e contemplação de todos os povos» (IM 11). Por isso devemos aos homens do nosso tempo, facilmente embalados e adormecidos com as toadas do «natal» do consumo, o testemunho autêntico do autêntico Natal. Porque «Jesus é verdadeiramente a realidade nova que supera tudo quanto a humanidade pudesse esperar, e tal permanecerá para sempre ao longo das épocas sucessivas da história. Deste modo, a incarnação do Filho de Deus e a salvação que realizou com a sua morte e ressurreição são o verdadeiro critério para avaliar a realidade temporal e qualquer projecto que procure tornar a vida do homem cada vez mais humana» (ibid.). «Ao anunciar Jesus de Nazaré, verdadeiro Deus e perfeito Homem, a Igreja oferece a todo o ser humano a perspectiva de ser «divinizado» e, dessa forma, tornar-se mais homem. Este é o único caminho pelo qual o mundo pode descobrir a sublime vocação a que é chamado, e realizá-la na salvação operada por Deus» (IM 2).
Na parte mais dispositiva, a Bula pontifícia estabelece «que o Grande Jubileu do Ano 2000 tenha início na noite de Natal de 1999, com a abertura da porta santa da Basílica de S. Pedro do Vaticano, que antecederá de poucas horas tanto a celebração inaugural prevista em Jerusalém e em Belém como a abertura da porta santa nas outras Basílicas Patriarcais de Roma» (IM 6). Uma vez, porém, que este Jubileu será celebrado simultaneamente em toda a Igreja, o Papa determina que também em todas as Catedrais o Bispo diocesano presida à sua inauguração com uma solene Liturgia Eucarística no dia do Natal do Senhor Jesus. Aliás, sugere-se que esta celebração comece com uma statio (reunião) da assembleia noutra Igreja, donde partirá em «peregrinação» para a Catedral. Em suma, a festa deverá ser notória e intensa, até porque «cada ano jubilar é uma espécie de convite para uma festa nupcial» (IM 4).
O Natal de 1999 deverá, assim, «ser para todos, uma solenidade radiante de luz, o prelúdio duma experiência particularmente profunda de graça e misericórdia divina, que se prolongará até ao encerramento do Ano jubilar no dia da Epifania de Nosso Senhor Jesus Cristo, a 6 de Janeiro do ano 2001. Cada crente acolha o convite que os Anjos anunciam incessantemente: «Glória a Deus nas alturas, e paz na terra aos homens por Ele amados» (Lc 2, 14). Deste modo, o tempo do Natal será o coração pulsante do Ano Santo, que há-de trazer à vida da Igreja a abundância dos dons do Espírito para uma nova evangelização (IM 6).
Estamos ainda no período preparatório do Jubileu, prestes a celebrar o Natal de 1998. Mas o Papa, ao publicar agora esta Bula, de algum modo deseja que o vivamos já na perspectiva do Jubileu, deste «evento que introduz a Igreja inteira num novo período de graça e de missão» (IM 3).