[ Especial ]



    D. António Ferreira Gomes: Um bispo no exílio em terras de Valência

    Nuno Vieira *


    Em finais da década de 50, a arquidiocese espanhola de Valência acolheu dois prelados a quem, nos seus respectivos Países e dioceses onde haviam sido nomeados Pastores, privaram do exercício das suas funções sagradas. Foram eles: D. Emílio Lisson Chaves, arcebispo titular de Metimna, Perú, sobre quem, neste momento, decorre o processo de beatificação; e D. António Ferreira Gomes, bispo de diocese do Porto, Portugal.
    Qualquer um destes prelados, de maneira activa e empenhada, colaboraram na acção pastoral protagonizada por D. Marcelino Olaechea, arcebispo de sede valenciana.
    Os motivos da permanência do bispo do Porto em terras estrangeiras, entre 1958-1969, são de todos conhecidos. Durante o exílio em Espanha, D. António residiu nas cidades de Vigo, Santiago de Compostela, Valência, Lourdes, Cidade Rodrigo e Alba de Tormes. Um trabalho de investigação acerca deste período seria muito oportuno e contribuiria notavelmente para a história do episcopado portuense.
    Visitando os arquivos metropolitanos de Valência, mais concretamente os livros das visitas pastorais entre os anos de 1960 e 1963, encontraram-se mais de 150 visitas efectuadas pelo bispo do Porto, e que se encontram distribuídas do seguinte modo: Novembro e Dezembro de 1960: 14 visitas; Janeiro a Maio e de Outubro a Dezembro de 1961: 68 visitas; Janeiro a Maio de 1962 - 37 visitas; Janeiro a Maio de 1963: 37 visitas
    A extensão da diocese de Valência era, já então, bastante considerável. O relatório sobre a situação das paróquias é minucioso e, através dele, podemos conhecer o estado das comunidades quer desde as acções litúrgicas até a serviços de catequese, caridade e outras formas distintas da piedade popular, como por exemplo a acção evangelizadora das confrarias e outras associações laicais. No jornais regionais da época vemos, pelas várias fotografias, em como o arcebispo de Valência não se coibia em fazer-se acompanhar por D. António em vários actos oficiais, quer fossem religiosos ou civis.
    As circunstâncias da vinda do D. António à diocese de Valência ainda estão por averiguar. Contudo, não parecerá surpreender em demasiado todos aqueles que conheciam bem a posição do prelado valenciano em relação ao poder político espanhol. Nas palavras do cardeal Tarancón, D. Marcelino Olaechea não era um homem que dissesse a tudo amén, expressão que permite entrever a disparidade de posições no episcopado da Espanha franquista. A afinidade política e a participação de ambos prelados no Concílio Vaticano II podem estar na origem da estadia prolongada do bispo portuense em terras do Túria. Este e outros temas serão objecto de futuros estudos acerca do bispo do Porto.
    Ainda hoje, com alguma frequência, ouvimos por terras de Valência testemunhos da época referentes "al Obispo de Oporto" recordando, até, ou o dia da primeira comunhão ou o da Confirmação. A intensa acção pastoral do D. António permitiu-lhe conhecer uma realidade distinta daquela que pastoreava. Mas esta actividade não se limitava ao contacto com as populações, pois também participou em tertúlias e conferências de carácter sócio-religioso.

    * Sacerdote e Investigador. Diocese de Segorbe-Castellón, Espanha