Para o homem hodierno, a palavra liberdade tem uma ressonância quase mágica. Ela é, de algum modo, a suprema aspiração da sua realização pessoal. Ser mais livre para poder viver melhor, é um dos horizontes da era da cibernética. Contudo, que significamos com tal palavra? Adiantamos um possível significado: saber o que se faz e porque se faz determinada acção; dar um sentido à vida e assumir pessoalmente esse sentido (A. Dondeyne). O homem em si mesmo sente a necessidade de assumir um conjunto de valores, para poder viver em harmonia com os outros. A existência humana, vive o seu sentido na representação articulada, entre as determinações sociológicas e a vontade, tendo por palco a própria liberdade. A liberdade é o espaço onde o homem joga a vida. É uma construção sempre adiada de nós mesmos.
A população prisional portuguesa é constituída, maioritariamente, por jovens e adultos com baixos níveis de escolaridade e provenientes de situações familiares precárias, originados quer pelo abandono precoce do sistema educativo e pelas dificuldades em aceder ao sistema de formação profissional, quer pela degradação económica e moral das famílias. Existem cerca de 15 mil reclusos, homens e mulheres, sendo alguns deles reincidentes. Destes, 60 a 70% retidos devido a crimes relacionados com a droga. O recluso torna-se o resultado de vários fracassos pessoais e sociais. Portanto, se a criminalidade continua a aumentar, também a sociedade deve interrogar-se sobre a origem de tal flagelo.
Como se constrói a liberdade nas cadeias portuguesas? O que se faz para lá das grades em conquista de um futuro diferente para quem nelas vive? Quais os problemas, os sofrimentos, os dramas, os sonhos de quem passa longos anos a expiar um crime? O que faz a sociedade na reinserção dos reclusos? Que oportunidades lhes são dadas quando já não existem muros? Como se libertam os toxicodependentes das drogas nas prisões portuguesas? Como se utiliza a terapia do desporto e da cultura na recuperação de valores perdidos? Que contributo dá a Igreja Católica ?
Para quem violou a liberdade possuída, os muros tornam-se apertados e as grades frias. Os dias começam longos e as noites perduram na longitude de uma solidão outrora habitada, num banco de jardim, numa família ou colégio. O recluso é um "soldado da liberdade, faz a guarda sob as estrelas em todas as noites da vida" (J. Herrero).
A visão da liberdade construída sob a repressão e a perspectiva da prisão como enclausuramento vegetativo, apresenta-se com um anti-humanismo arcaico. Só a sensibilização de consciências (por vezes deformadas) pode construir um mundo habitável. Enquanto estiver o castigo à frente da reinserção social nada se consegue e tudo são soluções ilusórias.
Já não vivemos no tempo da caridade sentimental sem qualquer acção imediata. Torna-se necessário abrir os olhos e reflectir, com abertura, os verdadeiros problemas da sociedade prisional. Fechar os olhos é semear frutos venenosos, que mais tarde ou mais cedo iremos comer.
A liberdade é para o recluso, uma luta que permite seu crescimento, encontrar a sua dignidade e realizar-se. Semelhante luta, não a pode travar sozinho. Ela só será eficaz se a sociedade aceitar recebê-lo de novo, deixando-o trilhar novos caminhos. A sociedade não pode esfregar mãos, como se tudo já estivesse feito ou perdido. Tem que dar o seu contributo, no acolhimento sincero e no rasgar de novas oportunidades. Para o recluso a liberdade "é a única razão de viver, a permanente conquista em que se forja a sua personalidade de anónimo, de lutador sem tréguas. Porque não é pedra, canta e sente - e aspira a continuar sendo águia sobre os cumes agudos de todas as serranias" (J. Herrero). Demonstra um sinal de liberdade, a liberdade de criar, a liberdade de sonhar, a liberdade de reinventar. Criar, sonhar, reinventar a vida, mesmo quando tudo parece perdido.
Ninguém pode estar condenado para sempre!
Pastoral Prisional de Braga