À Conversa Com... Frei Ignacio LARRAÑAGA
Ignacio Larrañaga Orbegozo é presbítero franciscano, capuchinho originário do País Basco. Tem desenvolvido um amplo trabalho animador e evangelizador, durante 25 anos, na América Latina, América do Norte e Europa. É Fundador dos Encontros de Experiência de Deus, que se iniciaram no Brasil em 1974, e das Oficinas de Oração e Vida, que datam de 1984. Transmitem de maneira pedagógica a sua mensagem, que foi levada, ao longo dos anos, a dezenas de milhares de pessoas. O Frei Ignacio Larrañaga é, também, autor de 16 livros que já alcançaram numerosas edições e foram traduzidos para 10 idiomas. As suas obras proporcionam análises e soluções, doutrinas e orientação para as necessidades e os problemas do ser humano, e têm ajudado milhões de pessoas a experimentar a alegria da libertação interior e a alegria de viver. Ainda que o autor seja católico, a sua mensagem é válida para qualquer cristão, qualquer crente e, simplesmente, para qualquer homem e mulher, conforme já se comprovou em muitas nações. De facto, muitos psicólogos recomendam os livros do Frei Ignacio Larrañaga aos seus pacientes.
VP - Frei Ignacio optou por uma vida e vocação franciscana. Desde logo, ao sentir e querer ser padre, estava decidido por qual o caminho rumo a Deus? Ou esteve no dilema entre ser diocesano ou de outra Congregação qualquer?
Frei Ignacio Larrañaga (FIL) - Deus vai levando as coisas de maneira imprevista. Com o tempo elas vêm. É verdade que a minha alma tem uma empatia especial com Francisco de Assis, tenho inclusive um livro "O irmão de Assis", e além do mais fundei um Instituto: Centro de Estudos Franciscanos e Pastorais para a América Latina. Assim, a minha vida está fortemente emparelhada com a de Francisco de Assis. Antes disto, a minha alma já respirava com Francisco de Assis. Nunca duvidei nunca da minha vocação e do meu carisma franciscano.
VP - O que é que lhe atrai mais no espírito franciscano?
FIL - Absolutamente duas coisas: humildade e amor. Francisco de Assis é este exemplo na Igreja. Lança o amor universal às criaturas não racionais e um amor infinito preferencialmente aos mais necessitados e, naquele tempo, aos leprosos e aos mais ruins e arruinados. Pode dizer-se que o amor foi o seu distintivo, mas um amor sedento dum coração vazio, pobre e humilde. Isto seduz a minha alma: ter um coração como o de Francisco e como o de Jesus, que nos diz: "Aprendei de Mim que sou manso e humilde de coração". Este caminho, que me seduz e em que trago as minhas limitações humanas, é o que faz brotar o amor universal.
VP - Como ultrapassar os obstáculos que abusivamente dominam e apagam estes valores da pobreza, humildade e caridade? Ou seja, como é ser franciscano nos tempos que correm?
FIL - Eu estou neste ideal muito firmemente. Não me comove absolutamente nada. Não me fazem nada nem me criam qualquer obstáculo, muito pelo contrário, dão-me alento para seguir esse ideal de S. Francisco.
VP - Se S. Francisco de Assis viesse hoje à Terra, em pessoa, o que acha que diria deste mundo? Sentir-se-ia defraudado e frustrado por ver esmorecidos tantos valores que defendeu ou sentir-se-ia mais feliz por ser grande o número dos seus seguidores e defensores dos seus princípios?
FIL - Bom. Frustado nunca! Nunca se sentiria frustrado, penso eu. É uma hipótese difícil de acertar. Haveria algo parecido, optar por esses ideais com fidelidade. Foi no seu tempo comprometido com todos. Não falaria contra nada: nem contra os comunistas nem contra os protestantes. Ele não teria nenhum inimigo em nenhuma parte. Ele era um nome harmonioso entre todas as religiões e todos os grupos políticos. Este é o eterno Francisco de Assis, com um amor incondicional.
VP - De que forma descreve os 25 anos de imenso trabalho de animação e evangelização já realizado por todo o mundo?
FIL - Explicação humana não tenho. Foi mesmo Deus que me tomou e me levou de um lado a outro, a milhares e milhares de grupos, lugares, aeroportos, 33 países e 4 continentes. Milhares de pessoas que me viram e escutaram. São 8 milhões de exemplares dos 16 livros já vendidos. As TOV estão distribuídas por 40 países. Para um só homem é demasiado. Um só homem não conseguia sem Deus. Agora Deus serviu-se de um instrumento, que sou eu, quando precisou de mim, como podia ter-se valido de outra pessoa. Aqui não há nenhum mérito nem explicação psicológica, ideológica e teológica. Sinceramente foi assim: fez-me servo pequeno e continuo servo até ao fim. Estou terminando a vida e fica uma obra imensa. Não me preocupo nem penso, pois ela é para glória de Deus e para a felicidade dos irmãos.
VP - Os Encontros de Experiência com Deus são uma obra manifestadora das suas capacidades de iniciativa, dinâmica e liderança. Em que consistem estes Encontros? Como e quando os proporciona?
FIL - Estes Encontros, que cumprem este ano os 30 anos, têm algumas condições, não implicam muitos estudos, mas partem sobretudo da vivência, da experiência pessoal com Deus. Traduzi estas experiências nos meus primeiros livros; atrás deste livros surgiram os Encontros e posteriormente a estes Encontros apareceram as Oficinas. Tudo parte duma experiência pessoal com Deus e em Deus. Deus pegou-me pela mão e mais não sei...
VP - Por curiosidade, sendo Frei Ignacio espanhol porque começou, em 1974, estes Encontros no Brasil e não em Espanha? Porquê o Brasil como rampa de lançamento?
FIL - Sim, assim é. Só Deus sabe. Pois os passos que dava como S. Paulo, de fraternidade e oração, fez com que lá mesmo me pedissem, durante uma semana, para eu falar de Deus e eles a falar com Deus nessa semana. Assim começaram os Encontros de Experiência com Deus. Foi por casualidade, não foi de maneira bem pensada, ordenada e organizada. Foi, portanto, espontaneamente. Só Deus sabe o que foi e como foi sendo.
VP - Segundo o Decreto do Vaticano, "Pontificium Consilium Pro Laicis", refere que as Oficinas de Oração e Vida (TOV) têm como objectivo principal ensinar os fiéis a orar de um modo ordenado e progressivo, através de cursos práticos, onde se aprende a rezar rezando. Porquê este nome de "Oficinas"?
FIL - Este nome porque é igual a uma oficina, em que se trabalha aprendendo e se aprende trabalhando. Aqui, orando se aprende a orar, pelo seu carácter prático e experimental. Esta é a razão do nome. Assim há muitos anos. E não se aprende somente a orar, é verdadeiramente uma nova evangelização praticada em 4 meses. A expressão "oficina de oração" presta-se a equívocos, crê-se que ensina a orar libertando-se de tristezas, mágoas e angústias; ensina-se a libertação interior profundíssima; ensina-se e se pratica a ser como Jesus, que era muito mais humilde, paciente e caridoso. É uma transformação integral da pessoa. Não se aprende a orar se não procura viver em toda a dimensão evangélica. De maneira que se pode dizer que se trata de uma nova evangelização: são 4 meses e não duas semanas!
VP - Presumo que esses 4 meses mantenham a sua estrutura inicial. Como é que são preenchidos no seu todo e nos seus conteúdos?
FIL - É um programa completíssimo. Há umas gravações, há manuais e uma série de elementos que ajudam os guias. Mas é um programa muito completo, não complicado. Não é fácil, mas simples e, ao mesmo tempo, profundo.
VP - Pode entrar qualquer fiel para as TOV?
FIL - Pode entrar qualquer fiel, naturalmente, até protestantes! Em muitos países temos protestantes participantes. Em princípio todo aquele que tenha fé e busque a Deus pode entrar e participar com grande fruto.
VP - Quantos católicos portugueses já passaram pelas TOV?
Quanto a números redondos, estimam-se cerca de 150.000 pessoas, mais 250 guias portugueses, aproximadamente, inseridos num total de 15.500 guias a nível mundial.
VP - Existem também as TOV para Jovens, que se distinguem por uma rigorosa pontualidade, uma estrita ordem e muita disciplina. Diz-se que os jovens de hoje não se deixam absorver e/ou não se querem submeter a métodos e normas rígidas. Mesmo assim, há bastantes jovens a corresponderem a estas exigências de vida na sua formação diária?
FIL - Assim é. Têm uma estruturação, dinâmicas e temas de reflexão muito diferentes das dos adultos. Não digo que assistam multidões, mas muitos jovens, sim, com verdadeiros frutos de transformação de vida. Muitos deles incorporam-se nas actividades da Igreja apostólica. Nós estamos contentes, ainda que não seja fácil conseguir o que pretendemos face a tantas seduções e coisas exteriores que inquietam os jovens. Porém, consegue-se, em muito boa escala, os frutos desejados.
VP - Quais são as outras grandes características e linhas das TOV para Jovens?
FIL - Bom, isso da pontualidade é em todo o lado que façamos. Produzi sempre essa disciplina ordenada e metódica. Não é uma coisa especial para jovens, mas uma maneira típica das Oficinas de Oração e Vida. A linguagem é muito mais adaptada para os jovens. O programa é também completo, em 10 semanas, mas não tanto como o dos adultos.
VP - O Frei Ignacio é igualmente (re)conhecido pelas suas obras literárias, por atingirem numerosas edições face à grande procura a nível mundial, daí as suas traduções numa dezena de idiomas. Os 16 livros já publicados são todos distintos entre si, nas suas temáticas e conteúdos?
FIL - Sim, são distintos. Há 3 perspectivas: os primeiros livros são livros que tratam de Deus, da relação com Deus. Outros tratam do próprio eu, da libertação interior e, outros ainda, tratam da relação de cada um com os demais, com o próximo. Há também livros sobre Maria e um sobre o matrimónio. Os primeiros livros estão escritos para os que não têm fé, não se pressupões tenham ligação de Deus. É a deliberação de si mesmo, de tratar do cansaço da vida, do fracasso, da morte. São capítulos diferentes. Não há qualquer lógica no sentido de ser primeiro eu, depois Deus e depois os outros. Não, não há esta prevalência.