António Rego
Pareceu, nos últimos dias do império, meio calada a presença da Igreja Católica em Macau ao longo destes 459 anos. Pouco se deu a ver, no meio dos festejos com sabor a velório, o papel fundamental dos missionários no significado daquele bocado de terra do tamanho da Lagoa das Sete Cidades. E há três vectores de presença indiscutível da Igreja: a afirmação espiritual, a educação e a acção social. Já nem se fala do pioneirismo evangelizador que significou em relação à China, mesmo dentro dos insucessos de missionários jesuítas.
Macau percebe bem a enorme confusão religiosa que paira sobre a China. O episódio da seita que se quis manifestar no último dia de Portugal é um aparente desafino na orquestra bem montada que dentro da China baralha para confundir: partiu a Igreja Católica ao meio dividindo-a em "fiel ao Papa ou à Pátria". O resultado chamado "Igreja patriótica" foi uma enorme confusão que colocou os cristãos quase inquisitorialmente perante outros cristãos. Os "patrióticos" acham os outros retrógrados e mártires inúteis. Os "fiéis a Roma" acham que os outros são traidores da sua fé em nome de uma sobrevivência artificial da Igreja.
A Igreja Católica ainda é considerada um império que se intromete em questões internas da China. Mais cedo ou mais tarde Macau terá de ligar-se a este tronco gigante. O tempo vai ajudar a clarificar. Macau pode ajudar a libertar a China em matéria Religiosa. Com os sinais institucionalmente sólidos de presença religiosa, em muitas áreas de educação, mormente com o Instituto Superior ligado à Universidade Católica Portuguesa. Macau nesta transição digna, apesar de dolorosa, pode constituir um marco novo no grande país "onde ardem milénios de memória".