[ Especial ]



    Escutismo

    O bacalhau à espanhola


    Estava na hora de um almoço colectivo do acampamento.
    A ementa, que tinha sido planeada dois meses antes, ditava que naquele almoço todos iam comer bacalhau à espanhola.
    O Joaquim, que pertencia à Patrulha Castor e que tinha como tarefa ser o cozinheiro da Patrulha, vinha pensando naquela ementa. Em algumas noites ao longo daqueles dois meses, tinha acordado sobressaltado com a ideia do bacalhau à espanhola.
    Detestava bacalhau à espanhola.
    Por sorte (pensou ele) não ficou destacado para a equipa que ia confeccionar aquela refeição.
    A sineta tocou para o almoço.
    Juntou-se o Agrupamento.
    Rezaram, agradecendo a Deus a refeição que iam comer.
    Os Lobitos formaram fila para receberem a comida.
    O Joaquim olhava de longe para a concha que, bocado a bocado, retirava da panela as batatas e os bocados de bacalhau mais ou menos esfiapado.
    Mas rapidamente olhava para longe, para as árvores, que se avistavam no cimo do monte ali ao lado.
    Chegou a vez da sua Patrulha ir para a fila.
    Joaquim não se levantou, mas o Guia obrigou-o a acompanhar a Patrulha.
    Já com a comida na marmita, mexia, mexia e nada, mesmo nada entrava na sua boca.
    O Guia repreendeu-o.
    - Come, Joaquim. Olha que ficas fraco.
    Várias vezes o Guia lhe chamou a atenção, mas de nada valeu.
    O Chefe de Secção foi avisado deste acontecimento.
    O Chefe veio e sentou-se ao lado do Joaquim.
    Perguntou-lhe o que se passava. E o Joaquim contou tudo o que o atormentava.
    O Chefe, depois de ouvir pacientemente, alertou o Joaquim para vários factos relacionados com os Acampamentos dos Escutas. Não são Acampamentos quaisquer. Há regras. Tem que haver unidade e respeito entre todos. Não dá para cada um fazer o que bem lhe apetece.
    Aquela comida tinha sido cozinhada por um grupo que merece todo o respeito e o Escuta, para ser mesmo Escuta, tem que ser delicado e respeitador.
    Aquela comida que estava no prato do Joaquim fazia falta no prato de muitas crianças por esse mundo fora. Deitá-la fora, para um Escuta cristão, torna-se num pecado.
    O Escuta, diz a nossa Lei, deve ser sóbrio e económico.
    O Joaquim ouvia atentamente, mas ao mesmo tempo estava muito inquieto.
    - Sabes, Joaquim, estás a crescer. Na vida nós somos capazes de fazer coisas que nem imaginamos. Nós, Escutas, estamos a treinar-nos para só fazermos coisas boas. Se fores capaz de comer o bacalhau à espanhola, mesmo que te custe, vais fazer muitos de nós mais alegres porque vimos o Joaquim a ser mais Escuta. Pensa nisto tudo que te disse.
    E o Chefe levantou-se e foi ver se a água para lavar a louça estava em condições de ser usada.
    O Joaquim ficou muito pensativo.
    De repente começou a comer.
    Fechou os olhos algumas vezes.
    Demorou um pouco, mas comeu tudo. É certo que várias vezes parou para acompanhar a comida com pão e água. Mas comeu tudo.
    No fim, mesmo antes de ir lavar a sua marmita, recebeu uma salva de palmas dos companheiros da Patrulha.
    Chegou junto do Chefe, que já estava a lavar uma panela da cozinha, e mostrou-lhe o prato limpo.
    O Chefe deu-lhe um abraço sem lhe tocar com as mãos cheia de espuma de detergente.
    O Joaquim disse-lhe - Obrigado Chefe por me mostrar que ainda tenho muito para aprender.
    O Espírito Santo pairava sobre aquele acampamento e alguns escutavam-n'O.

    Alexandre Leite