C. F.
Na semana passada recordávamos , a propósito da comemoração do centenário de Monsenhor Moreira das Neves, realizada pela Câmara de Paredes, algumas passagens que referenciavam a obra daquele sacerdote, enquanto poeta, jornalista, homem de cultura e de causas sociais.
Hoje damos conta de outros textos críticos sobre a sua obra, que revelam não só aceitação, mas algum deslumbramento sobre as suas qualidades.
Juízos críticos sobre a hora
Pois ao fazer este percurso, outras coisas se me depararam e tornaram conspícuas. A mais importante dessas foi um texto assinado por Z. O. (Zacarias de Oliveira), publicado na edição de 3 de Janeiro de 1953 de A Voz do Pastor, com o título O P.e Moreira das Neves, poeta da nova geração.
Vale a pena recolher algumas das afirmações desse artigo, escrito por alguém que na altura exercia uma constante actividade crítica sobre livros e leituras, com reconhecida competência e mérito (para além dos diversos livros que ia publicando sobre literatura, tanto de escritores nacionais como estrangeiros, bem como de formação humana, no campo moral, cultural e psicológico.
No desenvolvimento das suas considerações, Zacarias de Oliveira afirma que Moreira das Neves é credor da nossa admiração, e aponta razões: É o caso perfeito do sacerdote que soube ser artista e com o sacerdócio dignificou o artista e lhe descobriu outros temas, novas aspirações; o artista que faz da sua arte um degrau para a ascensão.
Cita versos em que podemos encontrar telúricos ressaibos de Teixeira de Pascoaes, como estes: Deixa o vento / Levar para as distâncias infinitas/ o som da terra que te sai disperso. Ressalta depois os temas Inquietação e Presença, título de um dos seus livros, como temas referenciais na sua poesia, e vê na sua concepção e na sua forma tanto as referências tradicionais da nossa tradição como influências do movimento modernista.
Cita os seus livros de poemas (Hóstia Florida e Lendas Eucarísticas e outros poemas, As Sete palavras de Nossa Senhora, livro suficiente só por si para consagrar um poeta, e Mendigo de Deus, poemas do sofrimento e da graça, em subtítulo.
Acrescenta depois uma referência à reflexão crítica do autor, referindo os títulos Inquietação e Presença, Guerra Junqueiro o Homem e a morte, O Grupo dos Cinco, além da edição monumental da Editora União Gráfica sobre o Cardeal Cerejeira.
Surgiram depois ainda obras sobre o que poderia chamar os escritores inquietos, como Camilo Castelo Branco, a quem dedica um trabalho de introspecção espiritual, como também a José Régio, António Correia de Oliveira e Antero de Figueiredo, entre outros.
Provavelmente este artigo de Zacarias de Oliveira surgiu inspirado pela publicação da Hóstia Florida, Lendas Eucarísticas, em segunda edição, que era referenciado já na edição de 6 de Março da ano anterior, 1952. Dizia o autor da nota crítica, assinado P. M. Fernandes, após afirmar que Moreira das Neves era um dos nossos maiores poetas: Ao lermos este livro, sentimo-nos entre lírios de imaculada alvura e parece que as letras se transformam em olhos e reflectir o brilho das estrelas.
E comenta ainda: Diz o autor na sua modéstia que Hóstia Florida não é sequer uma arcada de violino e que nela apenas se recolhem, como num búzio marinho, algumas das ressonâncias da devoção eucarística em que se embala, e contrapõe: Este é o mais belo trabalho que melhor exprime a sua alma sacerdotal.
(Informou Pinharanda Gomes, no final da apresentação deste texto, que o autor que assinava P. M. Fernandes era o Padre Manuel António Fernandes, que era de Tortosendo, Covilhã).